Relatório divulgado nesta segunda-feira (9) pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), atesta pela primeira vez, sem deixar margem de dúvida, que os humanos são responsáveis pelo aquecimento observado na atmosfera, terras e oceanos. As mudanças climáticas hoje estão afetando todos os continentes e a temperatura da superfície global da Terra subiu 1,09 ℃ entre o período de 1850-1900 e a última década. Isso é 0,29 ℃ mais quente do que no estudo anterior do IPCC, divulgado em 2013.
O relatório é a sexta avaliação desse tipo desde que o painel foi formado em 1988 e tem como objetivo dar aos líderes mundiais as informações mais precisas sobre a mudança climática antes de uma cúpula internacional que será realizada em Glasgow, na Escócia, em novembro. No total, são 3.900 páginas com anos de pesquisa sobre o clima e a colaboração direta de 200 cientistas de mais de 60 países.
A temperatura da superfície global, segundo o relatório, aqueceu mais rapidamente desde 1970 do que em qualquer outro período de 50 anos, pelo menos nos últimos 2 mil anos, com o aquecimento atingindo profundidades oceânicas abaixo de 2 mil metros.
As atividades humanas também afetaram a precipitação global (chuva e neve). Desde 1950, a precipitação global total aumentou, mas enquanto algumas regiões ficaram mais úmidas, outras ficaram mais secas. De forma geral, a frequência e a intensidade dos eventos de precipitação intensa aumentaram na maioria das áreas terrestres. Isso ocorre porque a atmosfera mais quente é capaz de reter mais umidade, aproximadamente 7% a mais para cada grau adicional de temperatura.
Mais eventos climáticos extremos
O relatório do IPCC também mostra que a influência humana foi detectada pela primeira vez em eventos extremos combinados. Como exemplo, são mencionadas as incidências de ondas de calor, secas e incêndios que acontecem ao mesmo tempo e agora passaram a ser mais frequentes. Esses eventos compostos foram vistos na Austrália, Sul da Europa, Norte da Eurásia, partes das Américas e florestas tropicais africanas.
De acordo com o pesquisadores, alguns extremos de calor observados recentemente, como o verão australiano de 2012–2013 , teriam sido extremamente improváveis sem a influência humana no clima.
‘Sentença de morte’ para combustíveis fósseis
O IPCC aponta que a velocidade com que o CO₂ atmosférico aumentou desde o período da Revolução Industrial (1750) é pelo menos dez vezes mais rápida do que em qualquer outra época durante os últimos 800 mil anos, e entre quatro e cinco vezes mais rápida do que durante os últimos 56 milhões de anos.
Aproximadamente 85% das emissões de CO₂ são provenientes da queima de combustíveis fósseis e os 15% restantes são gerados por mudanças no uso da terra, como desmatamento e degradação.
O secretário-geral da ONU António Guterres alertou que o relatório é um “código vermelho” para a humanidade. “Os alarmes são ensurdecedores e as evidências são irrefutáveis: as emissões de gases de efeito estufa da queima de combustíveis fósseis e do desmatamento estão sufocando nosso planeta e colocando bilhões de pessoas em risco imediato”, pontuou.
Guterres pediu o fim de novas usinas de carvão e de exploração e desenvolvimento de novos combustíveis fósseis, e que governos, investidores e empresas concentrem todos os seus esforços em um cenário futuro de baixa emissão de carbono. “Este relatório deve soar como uma sentença de morte para o carvão e os combustíveis fósseis , antes que destruam nosso planeta”, disse.
Oceanos ácidos e quentes. E mudanças climáticas irreversíveis
Ainda que um esforço global consiga limitar o aquecimento a 1,5 °C , impactos de longo prazo do aquecimento já em curso provavelmente serão inevitáveis e irreversíveis. Isso inclui o aumento do nível do mar, o derretimento do gelo ártico e o aquecimento e acidificação dos oceanos. O relatório aponta que reduções drásticas nas emissões podem evitar mudanças climáticas ainda piores, mas não farão com que o mundo volte aos padrões climáticos do passado.
Os oceanos absorvem 91% da energia do aumento dos gases de efeito estufa atmosféricos, o que levou ao aquecimento do oceano e a mais ondas de calor marinhas, principalmente nos últimos 15 anos. A acidificação, causada pela absorção de CO₂, ocorreu em todos os oceanos e está atingindo profundidades superiores a 2 mil metros no Oceano Antártico e no Atlântico Norte.
O derretimento dos mantos de gelo e das geleiras, junto com a expansão do oceano à medida que ele aquece, levou a um aumento médio do nível do mar global de 0,2 metros entre 1901 e 2018. Mas a velocidade de aumento do nível do mar está aumentando, passando de 1,3 milímetros por ano durante o período entre 1901 e 1971 para 1,9 mm anuais durante 1971-2006 e, depois, alcançando 3,7 mm por ano entre 2006 e 2018.
A temperatura da superfície da Terra continuará a aumentar até pelo menos 2050 em todos os cenários de emissões considerados no relatório. A avaliação mostra que a Terra pode exceder o limite de aquecimento de 1,5 ℃ no início de 2030. O aquecimento global permanece abaixo de 2 ℃ durante este século apenas em cenários onde as emissões de CO₂ atingem zero líquido por volta de ou após 2050.
Segundo o IPCC, para estabilizar o clima, as emissões de CO₂ devem chegar a zero líquido, e outras emissões de gases de efeito estufa devem diminuir significativamente. A humanidade precisa agir.