Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Adufes afirmam que postura do vereador se contrapõe ao direito à liberdade religiosa

O Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (Neab) e a Associação dos Docentes da Universidade Federal do Espírito Santo (Adufes) repudiaram, em nota, as falas do vereador Gilvan da Federal (Patri), que na sessão da Câmara de Vitória dessa segunda-feira (29), ofendeu as religiões de matriz africanaO discurso foi considerado “racista e criminoso” pelas entidades.Durante a sessão, Gilvan subiu na tribuna e mostrou detergente e bucha, que, segundo ele, seriam utilizados “para limpar a mesa e pedir orações a Deus para nos livrar de todo o mal”, referindo-se à benção feita por mães de santo no plenário durante a sessão solene em homenagem ao Dia da Consciência Negra, na última sexta-feira (26), proposta pela vereadora Karla Coser (PT).

Na nota, o Neab e a Adufes afirmam que “o ataque e a incitação feita pelo referido parlamentar contrapõem-se ao direito à liberdade religiosa de integrantes de religiões de matrizes africanas que tão somente se fizeram presentes à Câmara Municipal em comemoração ao Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, conforme Lei federal nº 12.519/2011”, além de expressarem “preocupação com a integridade física e moral de integrantes dessas religiões”.Também solicitam à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/ES), ao Ministério Público do Espírito Santo (MPES), à Defensoria Pública do Ministério Público Federal e à Comissão de Ética da Câmara de Vitória empenho para a defesa dos direitos dos cidadãos na apuração do caso. “Um parlamentar não pode continuar no cargo valendo-se de sua imunidade para praticar atos que contrariam os direitos e deveres previstos na Constituição Federal de 1988”, defendem.
Além da bucha e do detergente, o vereador mostrou uma bíblia, que afirmou ser sua “arma principal”. Gilvan classificou a benção das mães de santo como “uma afronta a Deus”, dizendo que “praticamente fizeram uma macumba”. E acrescentou: “vão dizer que isso é cultura, mas não é não. Cultuaram aqui dentro. Vão dizer que o estado é laico, que pode se fazer Umbanda, macumba, o que for. Pode, mas tem lugar apropriado”, disse.
Gilvan prosseguiu com os ataques às religiões de matriz africana dizendo que elas “não falam o nome de Deus” e defendeu que nem ao menos deveria existir o Dia da Consciência Negra. As ofensas por parte do vereador foram refutadas somente por Karla Coser e Camila Valadão (Psol). Os demais vereadores se omitiram. O presidente da Câmara, Davi Esmael (PSD), afirmou que “apesar de apresentar discordância sobre como as coisas são feitas, é de direito dela [Karla Coser] a realização da sessão”, não se opondo, porém, à pratica de racismo religioso.
Karla Coser destacou que Gilvan “destilou ódio, racismo religioso e incapacidade de compreensão. Afirmando ser católica, a vereadora falou “ter capacidade de estar em um espaço com as mães de santo e yabás, abençoando este plenário, assim como pastores vêm aqui abençoar, assim como padres vêm aqui abençoar”.
Camila Valadão afirmou que a atitude do vereador “é mais uma expressão do racismo religioso, lamentavelmente pregado muitas vezes por pessoas que estão na igreja e que deveriam ser exemplo de tolerância e amor, mas sobem na tribuna para usar a imunidade parlamentar para cometer crimes”.
A vereadora Karla Coser salienta que, mensalmente, há cultos religiosos na Câmara, além da leitura de versículos bíblicos na abertura e encerramento das sessões, mas nunca ninguém contestou.