Justificativa é de que as empresas hospitalares não teriam como arcar com os custos para o cumprimento do piso

O Espírito Santo já vivencia as consequências da aprovação do piso salarial da enfermagem. Apesar da conquista, agora a categoria passa a travar uma nova luta para garantir o próprio emprego. Isso porque já começaram as demissões na Grande Vitória com a justificativa de que as empresas hospitalares não teriam como arcar com os custos para o cumprimento do piso.

REAJUSTES

Durante a pandemia do coronavírus, ficou evidente para todo o Brasil a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) e dos trabalhadores da enfermagem para que vidas fossem salvas. No entanto, o que a crise sanitária também escancarou foram as péssimas condições de trabalho e remuneração a que estão submetidos os profissionais da saúde.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou o piso salarial da categoria em 4 de agosto. A lei prevê que os enfermeiros contratados pelo setor público e pelo setor privado nas regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) devem ganhar ao menos R$ 4.750. Técnicos de enfermagem ganharão ao menos 70% do valor definido para piso (R$ 3.325) e auxiliares de enfermagem e parteiras, 50% (R$ 2.375).

DEMISSÕES

O que antes eram projeções e receios, agora são questões concretas que terão de ser enfrentadas. Demissões em massa de enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras têm sido percebidas em grandes hospitais privados da Grande Vitória. “Aconteceram várias demissões de enfermeiros e de técnicos de enfermagem, a desculpa que estão dando é o piso. O hospital que trabalho demitiu mais de 100 profissionais. Até agora, cerca de aproximadamente 20 enfermeiros foram desligados de hospitais onde trabalhavam”, diz enfermeiro – que não quis ser identificado.

Em contrapartida, o Sindicato dos Enfermeiros no Estado do Espírito Santo (Sindienfermeiros-ES) alega ter conhecimento de apenas seis demissões da categoria de enfermagem. E, completou ainda, que o encerramento dos contratos se deram de forma pontual, a medida que o setor em que trabalhavam nos hospitais foram fechados, poucas semanas antes da aprovação do piso salarial da categoria.

ALERTA

A presidente do Sindienfermeiros-ES, Valeska Fernandes Morais de Souza, confirma a preocupação com novas demissões, que já começou a acontecer, e deve ser sentida com mais intensidade a partir de setembro. Grandes grupos hospitalares do estado já anunciaram que se recursos não forem encontrados para cobrir os novos gastos, os serviços precisarão ser reduzidos, ou seja, novos setores e leitos fechados. No entanto, se nada for feito, quem deve sofrer maiores reduções de postos de trabalho são os técnicos de enfermagem.

“Não sei dizer a quantidade correta, mas foram vários os demitidos, soubemos de 70 em uma unidade hospitalar, 100 em outra. E por aí vai. Só que o usuário do sistema privado tem que ter o atendimento correto e digno e os profissionais da enfermagem não podem ficar sobrecarregados. Agora, o que eles querem, é contratar como Pessoa Jurídica. Estão orientando a fazer cadastro em uma empresa, que só a taxa de entrada é R$ 1 mil. E, então, passaríamos a ser terceirizados desses hospitais. Mas a outra questão que fica é: até onde vai essas manobras para contratação?”, desabafa o enfermeiro.

MANOBRAS NAS CONTRATAÇÕES

De acordo com a presidente do sindicato, manobras de contratação já começaram a acontecer. “Uma profissional nos revelou que o hospital queria encerrar o contrato dela e a colocar como sócia. Mas será que no final do ano, vai ter participação dos lucros para eles? Estamos orientando os enfermeiros a não se sujeitarem a jornadas abusivas e situações indignas e ficarem atentos. E lembramos ainda que o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) proíbe que enfermeiros e técnicos de Enfermagem sejam contratados como microempreendedor individual (MEI)”, alerta Valeska.

A presidente do Sindienfermeiros-ES pede ainda que os enfermeiros que foram demitidos, procurem o sindicato para serem orientados e para que órgão possa acompanhar de perto as movimentações dos grupos privados de hospitais e, também, do setor público. E, que, em caso de atraso salarial ou o não pagamento dos novos valores, o sindicato deve entrar com ações na Justiça.

Vale ressaltar que a Confederação Nacional de Saúde (CNS), que representa os estabelecimentos de serviços de saúde no país, move no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade para derrubar a nova legislação.

ADEQUAÇÃO

Os pisos salariais deverão ser aplicados por todos os setores até o início do próximo exercício financeiro. Devido às eleições, que garantem o fim do exercício fiscal com respeito ao teto de gastos, a União e os estados deverão iniciar os pagamentos a partir de 2023.