O anúncio da separação de Preta Gil e Rodrigo Godoy movimentou o debate acerca de casais que se separam após a descoberta de câncer pelas mulheres. Especialistas afirmam que é comum isso acontecer quando elas adoecem e explicam as razões e motivos.

A SBM ilustra que mais de 70% das mulheres são abandonadas pelos cônjuges durante o tratamento de câncer de mama. Uma pesquisa realizada pelas universidades de Stanford e Utah e pelo Centro de Pesquisa Seatle Cancer Care Alliance, nos Estados Unidos, aponta que, depois de analisarem a vida de 515 homens e mulheres com câncer ou esclerose múltipla (doença degenerativa dos movimentos), a taxa de separação é de 11,6%.

Neste cenário, as mulheres doentes obtiveram uma taxa de separação (abandono) do parceiro de 20,8% contra uma taxa de 3% dos homens doentes. O que significa dizer que a mulher tem seis vezes mais chances de ser abandonada em situação doente pelo marido após a descoberta de uma doença grave.

A oncologista Juliana Alvarenga Rocha explica que existem razões por trás desse abandono, que, embora anteriores a doença, são potencializadas por ela. “Precisamos lembrar que existia um relacionamento antes da doença, que, se não possuem uma base sólida, podem quebrar”.

O diagnóstico e tratamento de câncer mexe com áreas fundamentais de um relacionamento, destaca a oncologista. “Afeta a intimidade, sexualidade e até finanças do casal. Todo cotidiano muda e, querendo ou não, se adapta a essa nova realidade. Por isso, é comum que relacionamentos enfraqueçam no período”.

Juliana explica que o abandono pode ser relacionado a insegurança do parceiro diante a brutalidade da doença. “É preciso que o apoio psicológico se estenda não só a paciente, mas também a toda família, para que ela se prepare para apoiá-la durante o tratamento que, muitas vezes, conta com cirurgias mutiladoras, quimioterapia, terapia e alguns efeitos colaterais”.

A oncologista Virgínia Altoé Sessa frisa que o apoio do cônjuge é imprescindível, desde que não seja por obrigação. “Quando estamos em uma situação difícil, qualquer que seja ela na vida, ter o apoio de quem se ama é essencial. Mas isso precisa ser algo saudável e real, precisa realmente ser apoio e não uma obrigação, fachada, um fazer só porque tem que fazer”.

Casos de abandono

As oncologistas apresentaram outros casos em que mulheres foram abandonadas durante o tratamento. Juliana relembra quando a filha de uma paciente contou que o relacionamento dos pais era emocionalmente abusivo ao ponto do pai simplesmente deixar a mãe de lado. “Ela me disse que, às vezes, sentia que o pai preferia que mãe morresse logo”.

Para quem está de fora, afirma a especialista, a primeira reação é se questionar por que ela não separa. “Mas, geralmente, não há condições para isso, justamente por se tratar de anos de relação em que, muitas vezes, a mulher depende financeiramente e emocionalmente desse relacionamento e, em um momento de dificuldade, se encontra ainda mais fragilizada”.

Virgínia Altoé elucida que também existem aqueles que participam do tratamento, mas, assim que a paciente melhora, terminam. “Eles auxiliam em todo o tratamento, mas, quando o tratamento acaba, o relacionamento também acaba. Ou pessoas abandonam a paciente logo no diagnóstico, no início do tratamento, e realmente abandonam o barco”.

Outros casos relembrados pela oncologista mostram a doença como gota d’água para o fim do relacionamento. “Conheço histórias de pacientes que já tinham um relacionamento conturbado e o câncer foi a gota d’água. O câncer fez com que a paciente ou o companheiro tivessem coragem de terminar o relacionamento porque já não viviam bem”.

Há outros em que o abandono foi uma surpresa total, diz Virgínia. “Pessoas que achavam que viviam bem e, quando vem o diagnóstico, percebem que elas não são prioridade e que algumas escolhas do parceiro não estão relacionadas ao bem-estar da família em geral. As pacientes descobrem um parceiro egoísta, que só pensa nele e isso, eventualmente, pode culminar no término do relacionamento”.

Existem também os casos das pacientes decidirem colocar um ponto final na história durante o tratamento. “São pacientes que toleravam um relacionamento porque têm filhos, já viviam aquela situação há muitos anos e, quando vem o diagnóstico do câncer, elas se dão conta de que a vida pode acabar. Muitas veem que não precisam disso. O câncer traz essa visão também e, muitas vezes, a própria paciente decide pela separação porque ela praticamente já vivia separada, mas morando na mesma casa. Eu visualizo muitas vezes esse empoderamento”, detalha a especialista.

Como demonstrar apoio?

Juliana Rocha ensina ainda formas de demonstrar esse apoio a paciente. “É muito importante que a pessoa se mostre disposta ao oferecer apoio”.

  • Se oferecer para ouvir e conversar;
  • Ajudar nas tarefas do dia a dia;
  • Acompanhar nas consultas, nos exames e na rotina do tratamento;
  • Incentivar pessoa ela cuide da alimentação, da saúde, da autoestima;
  • Respeitar o tempo e o espaço da pessoa;
  • Engajar o paciente para manter o máximo da rotina possível;
  • Buscar ajuda profissional psicológica: “Porque é muito difícil ver quem você ama doente. Então, você precisa também estar forte pra poder ajudar a paciente”.